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sábado, 12 de fevereiro de 2011


Segurança máxima?

A prisão que abriga hoje os dois presos mais perigosos do sistema prisional nacional, Luiz Fernando da Costa, o "Fernandinho Beira-Mar", o bandido número um no Brasil, e o colombiano Nestor Ramon Caro Chaparro, o "El Duro", o quarto da Colômbia, apresenta problemas gravíssimos que comprometem totalmente a segurança da unidade. O DE FATO obteve, com exclusividade, um relatório assustador sobre a suposta situação do presídio federal de Mossoró, que foi inaugurado em 2009.
As denúncias vêm justamente no momento em que o presídio federal de Mossoró é o grande assunto na mídia nacional, após a chegada do traficante Fernandinho Beira-Mar. O dossiê exclusivo foi feito por experientes agentes penitenciários federais que estão no Sistema Penitenciário Federal (SPF) desde seu início e já passaram por praticamente todas as unidades, ocupando cargos de destaque. Os autores autorizam a divulgação das denúncias, mas pedem que seus nomes não sejam revelados pela reportagem por temerem sofrer perseguições internas após denunciarem tantos problemas.
Ao todo, o relatório possui 15 itens que falam sobre os mais variados tipos de problemas existentes hoje na mais badalada prisão federal do Brasil - são quatro e uma quinta ainda será construída em Brasília (DF). O dossiê aponta que os dois aparelhos de raios-x, utilizados para revistar visitantes, estão quebrados. O mais grave é que um deles está com problemas há quase um ano. A revista é feita somente com detectores de metais portáteis. O aparelho que é usado para detectar drogas e explosivos, o espectômetro, já começa a apresentar problemas. Ele está sem manutenção há dois anos.
Os agentes explicam que o espectômetro praticamente não vinha sendo utilizado porque poucos agentes foram treinados para manuseá-lo. Aqueles que têm essa habilidade, não sabem nem ao menos como proceder em caso de um desses testes apontar positivamente. "Desde a sua compra, o Depen (Departamento Penitenciário Nacional) não produziu portaria orientando em que casos, como empregar e como proceder se os testes apontarem positivamente", reclama um dos agentes, acrescentando que os problemas nos equipamentos eletrônicos não param aí, colocando em xeque a segurança.
O sistema que monitora as câmeras, sensores e o acesso à unidade prisional já começou a apresentar pequenas panes que comprometem a segurança da unidade. Assim como outros aparelhos eletrônicos, não há uma equipe para fazer a manutenção do sistema de câmeras, o que coloca ainda mais em risco todo o sistema de segurança da unidade prisional. "Se assim continuar, esta unidade (Mossoró) ficará como as unidades de Campo Grande (MS) e Catanduvas (PR), onde quase nada funciona", denuncia um agente que já trabalhou em praticamente todas as unidades do Sistema Penitenciário Federal.
Hoje, ainda de acordo com o dossiê recebido pelo DE FATO, Beira-Mar poderia conversar tranquilamente com seus advogados e utilizá-los, caso eles aceitem, como porta-recados. É que o parlatório, sala onde preso e advogado conversam três vezes por semana, não possui sistema de escutas. Caso seja autorizado pela Justiça Federal que as conversas entre Beira-Mar e seus advogados seja gravada, não haveria como. O mesmo problema ocorreria no caso da visita (social ou íntima) ser suspensa por indícios de irregularidade. Se fossem para o parlatório, não seriam gravadas.
Outro problema apontado pelos agentes penitenciários federais é que presos podem ameaçar ou até mesmo agredir servidores públicos. No início do Sistema Penitenciário Federal, foi divulgado que qualquer tipo de contato entre presos e agentes seria gravado através de um microfone. O mecanismo impediria que agentes conversassem com presos e serviria até para a segurança dos servidores, em caso de uma ameaça, por exemplo, tudo seria captado pelo sistema. No dossiê, são citados inclusive casos de agressões contra servidores, fato que nunca chegou ao conhecimento da mídia nacional.
Segurança máxima fica sem segurança
O Sistema Penitenciário Federal (SPF) foi criado em 2006, seguindo os moldes das mais severas prisões dos Estados Unidos e da Europa. Ele foi idealizado para abrigar os mais perigosos criminosos do Brasil, isolando-os do comando de suas facções criminosas. Para tanto, foi feito um gasto gigantesco com estrutura física, equipamentos eletrônicos de última geração, treinamentos rigorosos de servidores e a utilização de armamento pesado. Tudo isso fez com que o SPF fosse considerado hoje um dos modelos mais seguros de unidades prisionais no mundo.
Porém, o relatório recebido pelo JORNAL DE FATO mostra que o sistema não é tão seguro assim, pelo menos no que diz respeito ao presídio federal de Mossoró. As armas estão sucateadas, o prazo de validade das munições está vencido, a iluminação é falha e o número de agentes que fazem a segurança externa chegou a cinco, fora os problemas estruturais como falta de água e rachaduras no prédio, que inclusive resultaram na interdição parcial da unidade em 2010.
O mais grave das denúncias é que, segundo o dossiê recebido pelo DE FATO, a proteção da prisão de segurança máxima já chegou ao cúmulo de estar sendo feita por apenas cinco agentes penitenciários federais. Em caso de uma tentativa de invasão, como ocorreu contra o presídio federal de Campo Grande (MS), onde Beira-Mar estava preso juntamente com outros bandidos influentes, a resposta seria mais complicada.
Além do efetivo reduzido, segundo as fontes do DE FATO, provocados por férias de servidores, operações em andamento, licenças e outros, os agentes penitenciários federais de Mossoró estão sem participar de treinamentos de segurança há cerca de cinco anos.
"A grande maioria dos servidores que fazem escoltas dos presos mais perigosos do país, transitam pelo Brasil em estradas, hospitais, aeroportos e fóruns sem ter realizado sequer um só tiro de fuzil ou pistola nos últimos cinco anos. Vale fazer justiça que a grande maioria realiza treinamentos periódicos por conta e recursos próprios", frisa o denunciante.
A respeito das armas, o dossiê afirma que todas estariam sucateadas, apesar do Sistema Penitenciário Federal estar funcionando desde 2006, quando a primeira unidade de segurança máxima foi inaugurada em Catanduvas, Paraná.
O maior problema seria justamente com as escopetas calibre 12, que inclusive foram usadas em operações de intervenção de crise nas prisões estadual do Rio Grande do Norte. A denúncia diz ainda que todas as munições do presídio federal já perderam a validade.
Outro problema que afeta diretamente a segurança da unidade prisional é com relação à iluminação, que seria deficiente - algumas luzes inclusive estão queimadas. Para complicar, o gerador, que é usado numa situação de emergência, estaria em mau funcionamento.
"Após relutar bastante resolvi tornar pública tais falhas como ato de desespero, por ver que todos internamente têm conhecimento destas questões, mas não parecem se importar ou têm medo da perseguição que fatalmente serão submetidos, mas ainda quero acreditar em um país forte, honesto e livre... Acreditar que podemos ter um serviço público de qualidade, especialmente no sistema penitenciário", desabafa um dos autores do dossiê enviado à reportagem do DE FATO.
Por fim, um dos denunciantes afirma que todos os problemas apresentados pelo dossiê podem ser facilmente constatados em uma inspeção feita pelo Ministério Público Federal ou Justiça Federal, que são responsáveis pela gestão e fiscalização das prisões federais de segurança máxima do Brasil.
Comando Vermelho se encontra na prisão
Os irmãos Luiz Carlos Gomes Jardim, o "Luiz queimado", e Luiz Paulo Gomes Jardim, o "Paulinho Madureira", 45, ambos transferidos do Presídio Serrando Neves (o Bangu 3), no Rio de Janeiro (RJ), para o presídio federal de Mossoró no início do ano passado têm a oportunidade de se encontrar e conversar durante o banho de sol. Eles e outros presos que vieram do Rio de Janeiro não estão totalmente isolados. A informação faz parte do dossiê obtido pelo DE FATO e é confirmada pela direção da unidade prisional.
A seleção de presos por área dos presídios federais é feita de maneira extremamente rigorosa, segundo o diretor, Kércio Silva Pinto. Ele explica que os líderes são isolados para não contaminar os demais, mas reconhece que não há como isolar todos os presos que vieram do Rio de Janeiro, como os irmãos que são membros de uma família que comanda parte do crime organizado em São Gonçalo e Niterói há 30 anos.
De acordo com o dossiê, os presos do Rio de Janeiro podiam conversar normalmente no momento do banho de sol. Kércio confirma a denúncia, mas afirma que esse contato não representa nenhum risco à segurança da prisão ou que eles utilizem esse contato para continuar mandando no tráfico.
O encontro, segundo o diretor, ocorre porque os presos foram inseridos em uma mesma ala e, fatalmente, se encontram quando saem da cela. "Tem alguns do Rio de Janeiro que estão juntos. Alguns estão na mesma ala, outros estão separados", confirma o diretor.
Em março do ano passado, o presídio federal de Mossoró recebeu sua primeira leva de bandidos considerados extremamente perigosos. Eram 11, todos do Rio de Janeiro, apontados como os chefes dos principais morros cariocas que são controlados pelos traficantes.
Dos 11, apenas um é da facção Amigo dos Amigos (ADA). O Restante é do Comando Vermelho, maior facção do Rio de Janeiro que tem como um dos seus principais líderes Fernandinho Beira-Mar, que agora se juntou aos 10 em Mossoró. Por enquanto, ele continua no isolamento e não teve contato com os internos.
Entre os 11 que vieram no ano passado, um deles, José Benemário de Araújo, mais conhecido como "Mandela", foi indiciado como um dos mentores da invasão ao Morro dos Macacos, em Vila Isabel, na Zona Norte do Rio de Janeiro, que resultou na queda de um helicóptero da Polícia Militar e dois policiais morreram.
A invasão ao Morro dos Macacos ocorreu no fim de outubro do ano passado. A investigação mostrou que Benemário não teria participado diretamente da ação criminosa porque estava preso, mas ordenado a invasão ao morro.
Direção nega maior parte das denúncias
As denúncias que colocam em xeque o título de "prisão de segurança máxima" foram rebatidas quase que integralmente pelo diretor da prisão federal de Mossoró, Kércio Silva Pinto, que está se afastando do cargo por problemas familiares.
Em meio às inúmeras denúncias, ele confirma que um dos aparelhos de raios-x da unidade prisional está com problemas há cerca de um ano, porém minimiza a questão afirmando que "o problema não é no aparelho, é só no teclado", destacando que o aparelho danificado não está na área de segurança máxima, onde ficam recolhidos todos os internos.
O aparelho defeituoso fica na parte administrativa, segundo Kércio Silva Pinto. "A área de segurança é uma coisa, a área administrativa é outra e essa não tem nenhum problema".
Quanto às supostas panes no sistema de monitoramento, o diretor nega, mas reconhece que ocorrem alguns problemas.
"O que às vezes acontece é um probleminha interno que logo é solucionado, mas pane não existe não. A transmissão que é feita para Brasília (DF), às vezes, tem algum problema, mas aqui (Mossoró) não tem não. Isso não é verdadeiro. São 280 câmeras e uma pode dar defeito, mas pane não é verdadeiro", esclarece Kércio Silva.
Quanto ao suposto favorecimento no que diz respeito à falta de equipamentos para monitorar conversas entre presos e advogados, Kércio é taxativo: "se a Justiça mandar, a gente grava agora mesmo".
"Só é feita gravação (da conversa de advogado com preso) com autorização judicial. Sem isso, não é feita nenhuma gravação. Nunca utilizamos, mas se disser que é para gravar, grava hoje mesmo. Nós temos técnicos aqui, mas nunca utilizamos porque não houve autorização judicial para isso".
Em meio à entrevista, Kércio, que é também delegado da polícia federal, mostra-se irritado com a série de denúncias existentes no relatório recebido pelo DE FATO e chega a atribuir as acusações a problemas pessoais com servidores do presídio federal. "Essa pessoa, ou essas pessoas, só pode ter alguma coisa contra mim. São denúncias sem o mínimo de fundamento, de pessoas que não merecem credibilidade", desabafa o diretor da prisão.
Administração garante título de segurança máxima
Entre a série de denúncias, uma das mais graves é com relação à suposta falta de segurança da unidade prisional de segurança máxima de Mossoró, que hoje abriga Beira-Mar, El Duro, 11 líderes de morros cariocas e um homem que é apontado como um dos maiores assaltantes do Brasil. A direção da prisão nega que haja qualquer tipo de falha nos procedimentos de segurança e que a prisão nunca operou com menos de 15 servidores por plantão. As deficiências no armamento também são negadas.
Segundo o dossiê recebido pelo DE FATO, o presídio teria operado com apenas cinco servidores, mas a direção nega. "Primeiro que cinco agentes só não pode. São quatro torres. Isso pode ter acontecido antes de inaugurar o presídio, mas depois que foi inaugurado nunca aconteceu isso. Nós temos agentes suficientes em Mossoró. São aproximadamente 200 servidores. Como é que teríamos só cinco num plantão?", questiona o diretor da prisão.
De acordo com a administração da unidade, são cerca de 40 servidores por turno. Porém, o número pode cair até pela metade em caso de agentes de férias, licença ou outros, mas nunca chegou a cinco.
"É um absurdo dizer que uma prisão de segurança máxima já operou com apenas cinco servidores. Não tem como isso acontecer. Isso só mostra a falta de credibilidade das denúncias recebidas pela reportagem", rebate Kércio, acrescentando que uma das prioridades na prisão, além de manter os líderes do crime organizado isolados das suas facções, é a segurança dos próprios servidores da unidade.
"Todas nossas armas são novas, de primeira geração e munição é o que nós mais temos aqui. A penitenciária foi inaugurada há cerca de dois anos e nós já renovamos todo o nosso estoque. Se tiver pra vencer, seriam utilizadas em treinamento. São munições novas. Nós não colocaríamos em risco a vida dos agentes penitenciários", acrescenta o diretor, negando a suposta utilização de munição vencida, bem como enfatizando o treinamento que é feito com os agentes.
* Jornal de Fato

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